terça-feira, 14 de setembro de 2010

A RTP PRESTOU UM MAU SERVIÇO À JUSTIÇA E AOS CIDADÃOS

Durante quase uma década, a Comunicação social fez do processo de pedofilia da Casa Pia, o seu filão de ouro, alimentando todos os dias a avidez da opinião pública, com todo o tipo de notícias.

Os Órgãos de Informação, escritos e falados, promoveram a mediatização do processo, não só pelo facto de incluir figuras públicas ilustres mas também para daí tirarem os respectivos proveitos.

Nesse espaço de tempo, entre 2002 e 2010, milhares de processos foram investigados, julgados, absolvidos e condenados sem intervenção da Comunicação Social. Normalmente, os processos que são objecto da atenção dos media, acabam todos em águas de bacalhau, porque o segredo de justiça é constantemente violado para que os arguidos tenham oportunidade de melhor preparar a sua defesa.

No processo Casa Pia, compreendeu-se perfeitamente, ao longo do tempo, quais os órgãos de informação que trataram o assunto com isenção, os que se colocaram ao lado das vítimas e os que descaradamente defenderam os arguidos.

Em minha opinião, nenhum tratou do processo com isenção e alguns publicaram informação tendenciosa, quase sempre para desacreditar as vítimas.

Agora que o processo foi julgado e aplicadas as penas possíveis, os mesmos órgãos de comunicação social, insistem em desacreditar as vítimas e o colectivo de juízes que conduziu o processo, não dando descanso ao pesadelo dos jovens violentados que dura desde crianças.

Que pretendem esses órgãos de informação? Promover um novo julgamento na praça pública? Porque não deixam a justiça actuar e teimam em dar visibilidade e em tratar de forma diferente, os vários intervenientes no processo?

Durante todos estes anos, os alunos da Casa Pia, vítimas de abusos, foram constantemente apelidados de mentirosos pelos arguidos e pelos seus advogados e, no fundo, tratados como mercadoria fora de prazo. Pois agora que foi provada a sua razão no processo principal mas também noutros processos que lhes foram movidos por figuras públicas que eles denunciaram, dizendo claramente as sentenças que os seus testemunhos são credíveis e que as crianças não mentiram, a informação escrita e falada, continua a privilegiar quem já foi condenado quando devia colocar um ponto final no assunto.

Convoquem os meninos abusados para ir à televisão relatar os horrores que sofreram dos abusadores, mencionar os seus nomes, falar dos seus hábitos e costumes e, porque não, descrever até as características do seu corpo. Façam isso, para que algumas dúvidas que possam ainda pairar na opinião pública, sejam definitivamente dissipadas e para repararem a falta de isenção com que o processo tem sido tratado.

Quem não segue de perto as peripécias deste processo, ao ver e ouvir as notícias sobre o mesmo, pode facilmente ser induzido em erro, pensando que os abusadores são as vítimas e as vítimas são os abusadores.

Afinal, neste País, parece que funciona tudo ao contrário e, por isso mesmo, assistimos todos os dias, calma e tranquilamente, à repetição da velha história do lobo e do cordeiro, sem que ninguém se insurja contra tal aviltamento.

A Comunicação Social deve utilizar o seu imenso poder e influência para ajudar a descobrir a verdade, em todas as situações e circunstâncias, estando em causa gente modesta ou poderosa, com respeito absoluto pelos valores da isenção e imparcialidade.

A Comunicação social, desde que não apresente factos concretos que possam ajudar a esclarecer a verdade, deve abster-se de opinar sobre quem é culpado ou inocente porque essa tarefa pertence exclusivamente à justiça e deve ser respeitada.

Enquanto isso não acontecer, continuaremos a assistir, repetidamente, a patéticas manobras de diversão que nos indignam e envergonham a todos.

No último programa "Prós & Contras", um ex-casapiano abusado, deu a cara e com uma serenidade impressionante, respondeu às questões da moderadora. Em determinado momento, admitiu que tanto ele como provavelmente outros colegas vítimas de abusos, tiveram que descrever com mais ênfase, as práticas abusivas de que foram vítimas, para que as autoridades acreditassem nos seus relatos.

Toda a gente sabe que ao longo de décadas, os jovens casapianos abusados, denunciaram essas sevícias aos superiores da Instituição e até aos governantes mas todos ignoraram as suas queixas. Para uns quantos indivíduos poderosos e sem escrúpulos usarem e abusarem dos meninos as vezes quizeram, foi necessário criar a ideia, dentro e fora da Casa Pia, que os jovens eram uns refinados mentirosos compulsivos, com o objectivo de os descredibilizar e de não serem levadas a sério as suas denúncias.

Foi neste contexto que o ex-casapiano afirmou que, por vezes, foi necessário dar mais ênfase aos relatos sobre os abusos para se fazerem acreditar. Porém, a moderadora, como que ignorando o significado da palavra (exageração no tom de voz ou nos termos empregados, relevo, realce), insistiu diversas vezes com o casapiano para explicar o que queria dizer "dar mais ênfase aos relatos", na mira de lhe arrancar alguma declaração bombástica. Não o conseguiu porque o ex-casapiano não disse mais do que aquilo que a palavra significa. Mesmo assim, no final da sua extensa intervenção, o Senhor Carlos Cruz afirmou que essa referência do ex-casapiano foi a coisa mais importante que se passou no programa!!!

Portugal inteiro assistiu incrédulo e atónito ao tratamento dado pela RTP ao Senhor Carlos Cruz, em três programas consecutivos: Telejornal, Grande Entrevista e Prós e Contras, sendo que neste último, teve até o privilégio de moderar a própria moderadora!

Que mau serviço a RTP prestou à Justiça e aos cidadãos! Um canal público, pago por todos os portugueses, não pode enveredar por este tipo de actuações, sem o mínimo de rigor e isenção e atentatórias do bom nome da Estação.

Este post foi redigido logo após os acontecimentos que lhe deram origem mas entendi que deveria deixar passar algum tempo para ver se a minha opinião se alteraria. De facto a minha opinião continua rigorosamente igual e, por isso mesmo, faço hoje a sua publicação, solidarizando-me com os milhões de portugueses que se indignaram com a actuação da RTP.

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