domingo, 26 de abril de 2009

Porquê comemorar o 25 de Abril?


Há 35 anos, então com a idade de 24, vivia feliz com a minha família, num País de grandes dimensões, em franca prosperidade e que tinha uma população extremamente reduzida se comparada com os mais de um milhão de quilómetros quadrados.

Quando pela primeira vez ouvi falar do golpe militar do 25.04.74 que pretendia pôr fim ao regime de ditadura instalado em Portugal há mais de quarenta anos, regozijei-me com tal acontecimento e pensei imediatamente que o fim da ditadura poderia dar finalmente aos portugueses a almejada liberdade e um regime democrático que restaurasse a dignidade de um povo cansado de tanto sofrer e promovesse a igualdade entre as pessoas no acesso ao emprego e a salários dignos, à habitação, à educação, à justiça e à saúde.

Pensei também imediatamente que os militares envolvidos no derrube da ditadura, eram homens responsáveis e inteligentes que sabiam o que estavam a fazer e o que queriam para Portugal e que tinham também avaliado com rigor a situação das Colónias portuguesas em África, onde havia grandes interesses de Portugal e onde estavam radicados mais de um milhão de portugueses.

Eu que tinha tomado uma decisão de permanecer naquele grande espaço português em África, que também considerava meu, desde que as autoridades portuguesas acautelassem os interesses de todos quantos lá viviam, depressa me apercebi que tinham abdicado de tal tarefa, quando comecei a constatar que a tropa portuguesa e a polícia era constantemente ridicularizada pelos guerrilheiros dos diferentes Movimentos de Libertação, incapazes de manter a ordem e proteger as populações; por outro lado, os armazéns de armamento eram saqueados, havia frequentes confrontos entre os Movimentos de Libertação, aterrorizando as populações; havia perseguições, fuzilamentos, linchamentos e pilhagens; depois ocorreu a farsa dos Acordos do Alvor que ainda contribuiu para o agravamento da já difícil situação, a capitulação total do Exército Português a um dos Movimentos e o consequente abandono da população portuguesa à sua sorte.

Num cenário do salve-se quem puder, a economia depressa rebentou. Não havia comércio, não havia géneros alimentícios e as populações procuravam agora salvar alguns pertences e sair o mais rapidamente do País, por terra, mar ou ar, abandonando todos os bens que conseguiram ao longo de muitos anos de árduo trabalho.

Seguiu-se um gigantesco êxodo para todos os Continentes, em especial para Países de África, Europa e América.

Há relatos impressionantes de pessoas desesperadas e muito corajosas que fugiram, rumo a outros Continentes, em frágeis embarcações de pesca, equiparadas a traineiras; há relatos de caravanas em fuga, atacadas pelos guerrilheiros dos Movimentos de Libertação que para além de saquearem e matarem, levavam também mulheres e crianças como reféns, gerando cenários de grande desespero e horror.

Mas depois de chegar a Portugal, após ter fugido para a África do Sul e ter passado várias semanas nos diversos campos de acolhimento a refugiados, pude constatar a fragilidade do regime recém-criado, com ocupações selvagens, greves, perseguições, saneamentos, nacionalizações, indisciplina nas Forças Armadas e tentativas falhadas de golpes militares como o 11 de Março e o 25 de Novembro, não esquecendo o célebre Verão Quente de 1975 que se caracterizou por uma grande instabilidade e anarquia no Governo, nas Forças Armadas e na Sociedade.

Aqui, no meu País de origem, provei o sabor amargo da discriminação, pelo facto de ter regressado de uma Colónia portuguesa com o rótulo de "retornado" e sofri vexames e injustiças que felizmente ultrapassei sem ter cometido nenhuma loucura.

Trinta e cinco anos depois do 25 de Abril, continuo a ser maltratado pela Justiça, a saúde está cada vez mais inflaccionada, a educação é o que se vê, em constante guerra aberta entre professores e Ministério, o emprego é uma calamidade, da habitação nem se fala e a tão apregoada igualdade de tratamento para todas as pessoas, independentemente do seu estatuto social, económico ou político, não passa de uma longínqua miragem.

Por outro lado, este período de três décadas e meia cavou um fosso ainda maior entre ricos e pobres, eliminando quase por completo as classes médias, sendo visível, a olho nu, um aumento considerável do número de pobres.

Resta recordar nesta evocação de tão importante efeméride que os golpistas do 25 de Abril prometeram ao povo, liberdade, educação, saúde, Justiça, emprego, habitação e como se constata, a dura realidade é bem diferente, continuando por cumprir, em boa medida, tão solenes e revolucionárias promessas.

Pela minha parte, não tenho qualquer dúvida em afirmar que não se cumpriu Abril e que atravessamos um período onde são bem visíveis as fragilidades em que sempre esteve mergulhado este regime democrático e a sua economia.

Foi o regime instalado no 25 de Abril que me impediu de ser feliz em Angola, onde adorava viver e onde tinha granjeado uma situação económica estável, fruto de muito trabalho; foi esse regime que me discriminou no emprego, em Portugal, onde passei por grandes dificuldades e privações; que não me concedeu a reforma com 36 anos de serviço prestado ao Estado, porque alterou as regras quando me faltavam apenas alguns meses para atingir esse tempo; e foi este regime que permitiu uma série de excessos aos mais poderosos, os quais têm impedido o progresso e o bem-estar de todos os portugueses.

Porque hei-de eu comemorar o 25 de Abril?

Ano após ano, ainda não encontrei razões suficientes e sobretudo vontade para me associar às comemorações. A minha atitude é neutra, pelo que o 25 de Abril para mim, é um dia como os outros.
Não sou político e cada vez acredito menos nos homens que fazem vida da política. Mas ainda bem que assim é, porque se tivesse sido, passados 35 anos de promessas por cumprir e de exigências constantes de sacrifícios ao povo, como homem eticamente bem formado que sou, sentir-me-ia um falhado, frustrado e desgostoso com tal situação.
É assim que se sentem todos aqueles políticos que contribuíram para a situação descrita?

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